SOBRE O NATURAL E O SOBRENATURAL

O texto de Marcelo Gleiser, físico brasileiro radicado nos EUA, autor do livro “Criação Imperfeita”, nos trás uma profunda reflexão sobre o que fazer frente ao desconhecido. Lucrécio dizia que as pessoas vivem aterrorizadas pelo que não podem explicar. Buscamos respostas na ciência ou aceitamos simplesmente explicações baseadas no sobrenatural? O físico Richard Feynman dizia “ prefiro não saber do que ser enganado. Tire suas conclusões :

O que fazer frente ao desconhecido? Existem duas alternativas: ou se acredita na capacidade da razão e da intuição humana em vencer obstáculos e chegar a um conhecimento novo, ou se acredita que existem mistérios inescrutáveis, criados por forças superiores.
Em outras palavras, ou se vive acreditando em causas naturais por trás do que ocorre no mundo, ou se acredita em causas sobrenaturais, além do explicável.
Quando falo sobre isso, com freqüência me perguntam se não seria possível uma conciliação entre as duas: parte do mundo sendo natural e parte sobrenatural. Não vejo como isso poderia ser feito.
No meu livro recente “Criação Imperfeita”, argumentei que a ciência jamais será capaz de responder a todas as perguntas. Sempre existirão novos desafios, questões que a nossa pesquisa e inventividade não são capazes de antecipar.
Podemos imaginas o conhecido como sendo a região dentro de um círculo. Não há duvida de que à medida em que a ciência avança, o círculo cresce. Entendemos mais sobre o universo, sobre a vida e sobre a mente.
Mas mesmo assim o lado de fora do círculo permanecerá sempre lá. A ciência não é capaz de obter conhecimento sobre tudo o que existe no mundo.
E por que isso? Porque na prática, aprendemos sobre o mundo usando nossa intuição e instrumentos. Sem telescópios. Microscópios e detectores de partículas, nossa visão de mundo seria mais limitada.
A tecnologia abre novas janelas para um mundo que, outrossim, permanecer4ia invisível à nossa limitada percepção da realidade. Porém, tal como nossos olhos, essas máquinas tem limites Existem outros, ligados à própria estrutura da natureza, como o princípio de incerteza da mecânica quântica. Mas eles podem mudar com o avanço da ciência.
Essa imagem, de que o conhecido existe em um círculo e que muito do mundo permanece obscuro pode gerar confusão. Ou ainda pode ser manipulada por aqueles que querem inculcar nas pessoas um senso de que estamos cercados de forças ocultas que, de algum modo, controlam nossas vidas. É aqui que entram as alternativas que mencionei.
Parafraseando o poeta romano Lucrécio, as pessoas vivem aterrorizadas pelo que não podem explicar.
Ser livre é poder refletir sobre as causas dos fenômenos sem aceitar cegamente “explicações inexplicáveis”, ou seja, explicações baseadas em causas além do natural.
Essa escolha exige coragem. Implica na aceitação de que certos aspectos do mundo, apesar de inexplicáveis não são sobrenaturais.
Não é fácil ser coerente, quando algo de estranho ocorre, uma incrível coincidência, a morte de um ente querido, uma premonição, algo que foge ao comum. Mas como dizia o grande físico Richard Feynman, “prefiro não saber do que ser enganado”. E você?

Marcelo Gleiser, professor de física e autor do livro “Criação Imperfeita”

ÁFRICA DO SUL ENTRE O SONHO E A REALIDADE

SOCCER CITY

Terminou mais uma Copa do Mundo. A África do Sul viveu 40 dias de sonho. Agora é voltar à realidade e reencontrar-se com o cotidiano. Cerca 3,5 milhões de trabalhadores certamente ficaram sem trabalho, ou voltaram a ficar sem trabalho. As diferenças sociais gigantescas entre ricos brancos e pobres negros continuarão como dantes. Cinco estádios gigantes e maravilhosos ficarão semi- abandonados. Cerca de 3,2 bilhões de dólares foram gasto só na construção e/ou reforma dos estádios.
O problema de transportes coletivos não foi resolvido, nem de longe. Houve apenas uma grande preocupação com o transporte e acomodação de turistas. Para a população local quase nada mudou.
O país é depois da Índia o segundo com o maior número de infectados com o vírus da AIDS, cerca 5,5 milhões de pessoas, 11% da população total. Apesar disso é um país que possui um dos índices mais elevados de estupros no mundo, segundo estatística 2004/2005 era de 118,3 para cada 100.000 habitantes, ou seja cerca de 55.000 estupros por ano.
Relatório de 2006 apontava que o índice de expectativa de vida da população sul africana era de 50,9 anos.
Os índices de desemprego, analfabetismo, miséria são altíssimos, mas aí estão erguidos os gigantescos e belíssimos estádios.
Em 2014 será a vez do Brasil. Será que o país vai enfrentar a sua realidade para transformá-la ou vai simplesmente passar a maquiagem para mostrar uma grandeza que existirá apenas em volta dos estádios, para turista ver.
Não nos iludamos. Uma nação é o seu povo e o resultado de seu trabalho. E esse trabalho só trás benefícios se cada camada da sociedade receber o justo valor que lhe cabe.
12 de julho - a volta à realidade em Joanesburgo

Parabéns África do Sul pelos seus belos estádios.
OBESIDADE MENTAL
Qualquer tipo de obesidade é má! Se for mental...pior ainda!!!




Um texto discutível e de autor aparentemente desconhecido, mas que pode nos levar a longas reflexões sobre a realidade que vivemos na era da Informática.

Há apenas algumas décadas, a Humanidade tomou consciência dos perigos do excesso de gordura física por uma alimentação desregrada. É tempo de se notar que os nossos abusos no campo da informação e conhecimento estão criando problemas tão ou mais sérios que esses.
A nossa sociedade está mais atulhada de preconceitos que de proteínas, mais intoxicada de lugares-comuns que de hidratos de carbono. As pessoas viciaram-se em estereótipos, juízos apressados, pensamentos tacanhos, condenações precipitadas. Todos têm opinião sobre tudo, mas não conhecem nada.
Os cozinheiros deste magno fast food intelectual são os jornalistas e comentadores, os editores da informação e filósofos, os romancistas e realizadores de cinema.
Os telejornais e telenovelas são os hamburgers do espírito, as revistas e romances são os donuts da imaginação.
O problema central está na família e na escola. Qualquer pai responsável sabe que os seus filhos ficarão doentes se comerem apenas doces e chocolate.
Não se entende, então, como é que tantos educadores aceitam que a dieta mental das crianças seja composta por desenhos animados, videojogos e telenovelas. Com uma «alimentação intelectual» tão carregada de adrenalina, romance, violência e emoção, é normal que esses jovens nunca consigam depois uma vida saudável e equilibrada.
O jornalismo alimenta-se hoje quase exclusivamente de cadáveres de reputações, de detritos de escândalos, de restos mortais das realizações humanas. Boa parte da imprensa deixou a muito de informar, para apenas seduzir, agredir e manipular em busca de índices de audiência.
Os repórteres se desinteressam da realidade fervilhante, para se centrarem apenas no lado polêmico e chocante. Só a parte morta e apodrecida da realidade é que chega aos jornais.
O conhecimento das pessoas aumentou, mas é feito de banalidades.
Todos sabem que Kennedy foi assassinado, mas não sabem quem foi Kennedy.
Todos dizem que a Capela Sistina tem teto, mas ninguém suspeita para que é que ela serve.
Todos acham que Saddam é mau e Mandella é bom, mas nem desconfiam porquê.
Todos conhecem que Pitágoras tem um teorema, mas ignoram o que é um cateto.
Não admira que,no meio da prosperidade e abundância, as grandes realizações do espírito humano estejam em decadência. A família é contestada, a tradição esquecida, a religião abandonada, a cultura banalizou-se, o folclore entrou em queda, a arte é fútil,paradoxal ou doentia.
Floresce a pornografia, o cabotinismo, a imitação, a sensaboria, o egoísmo. Não se trata de uma decadência, uma «idade das trevas» ou o fim da civilização, como tantos apregoam. É só uma questão de obesidade. O homem moderno está adiposo no raciocínio, gostos e sentimentos. O mundo não precisa de reformas,desenvolvimento, progressos.
Precisa sobretudo de dieta mental.