Por ocasião do aniversário da morte de Tiradentes, discutiu-se sobre as interpretações que os historiadores brasileiros deram a seus personagens históricos tranformando-os em mitos.
Vêm então à mente uma série de personalidades e fatos históricos que hoje são questionados num processo de desconstrução da história até agora tida como verdade absoluta e que de repente descobrimos termos sido iludidos por anos ou mesmo séculos. É o caso de Aleijadinho, Santos Dumont, Tiradentes, o quadro da independência do Brasil de..., a guerra do Paraguai e por aí vai. O livro pode ser lido quase na íntegra no Google books.
A historiadora Guiomar de Grammont da Universidade Federal de Ouro Preto, publicou em 2008 o livro “Aleijadinho e o Aeroplano”. A obra mostra como a imagem do escultor mineiro Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, não veio de documentos históricos, mas da cabeça de um escritor.
A primeira biografia de Aleijadinho foi escrita pelo jurista e deputado mineiro Rodrigo Ferreira Bretas em 1858, 44 anos após a morte do escultor. Baseado em documentos de origem duvidosa e em depoimentos de pessoas dá o nascimento de Aleijadinho em 29 de agosto de 1730 em Vila Rica (atual Ouro Preto) e sua morte em 18 de novembro de 1814. Mesmo sem fontes ou documentos para provar o que dizia, Bretas descreveu seu personagem com detalhes horripilantes. A partir dos 47 anos o escultor teria sofrido de uma doença desconhecida, que o fizera perder os dedos, os dentes e curvar o corpo. Para poupar os passantes de topar com sua feiúra, o homem entocava-se em igrejas, separado do mundo com cortinas improvisadas. Para a historiadora Guiomar, o mais provável é que a fonte de inspiração da biografia de Bretas eram personagens literários populares no século 19, como Quasídomo, o corcunda de Notre Dame do livro do escritor francês Victor Hugo. Os dois são impressionantemente parecidos. Como Aleijadinho, Quasídomo era um belo-horrível: apesar de ter uma aparência desfigurada era capaz de boas ações. A descrição de Victor Hugo caberia muito bem a Aleijadinho.” A careta era o próprio rosto, ou melhor, a pessoa toda era uma horrível careta, entre os dois ombros uma enorme corcunda; um sistema de coxas e de pernas tão estranhamente tortas que se tocavam apenas por meio dos joelhos” O personagem de Bretas era tão fascinante que pegou. O biografo ganhou prêmios de D. Pedro II e virou sócio correspondente do instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.
No começo do século 20, os modernistas viram em Aleijadinho a expressão da cultura mestiça brasileira, já que o escultor era filho de um português com uma escrava. O problema é que isso é uma das poucas coisas que se sabe sobre Antonio Francisco Lisboa. Não só a biografia escrita sem base em documentos e décadas depois de sua morte não ajuda, como também há outro empecilho: não dá para saber quais obras realmente são dele. Não havia o costume de assinar esculturas naquela época. Mas a fama de Aleijadinho explodiu. O número de obras atribuídas a ele explodiu. Na década de 1960 eram cerca de 160 esculturas; hoje são mais de 400. Ao que parece a verdade não importa tanto. A aura vale mais.