Ao considerar os melhores exemplos da presença feminina no mundo político, pensa-se automaticamente nos países escandinavos. Entretanto, o país que encabeça a lista com maior representação feminina no parlamento se encontra no coração da África: Ruanda.
Localizada em uma das regiões mais conflituosas da África, Ruanda é um pequeno país de terras férteis, com uma das densidades populacionais mais altas do mundo: aproximadamente 400 habitantes por quilômetro quadrado.
O país é um dos líderes em um fenômeno global que está repercutindo também na África: o fortalecimento da posição da mulher - um processo que na África foi realizado com surpreendente rapidez. Em duas décadas, a representação parlamentar das mulheres no continente cresceu de 6%, em 1988, a 18% atualmente.
No caso de Ruanda, esta cifra é recorde, com 56% de participação feminina no parlamento. A Suécia é o segundo país, com 47% de parlamentares mulheres. No Brasil, a participação feminina no Congresso Nacional não passa de 9%.
Desde as eleições gerais de 2008, elas representam 56,3% dos deputados: um recorde invejável até mesmo aos países escandinavos, campeões da paridade política na Europa. As ruandesas obtiveram o direito ao voto apenas em 1961, quando o país conquistou a independência. Em 1965, a primeira eleita assumiu seu posto no Parlamento, mas até os anos 1990 as mulheres estiveram praticamente ausentes do mundo político. Foi o genocídio dos Tutsi em 1994 que modificou esse cenário. “Quando muitos homens morreram ou ficaram incapazes de agir, as mulheres assumiram responsabilidades e mostraram que podiam estar à altura”, relembra Immaculée Ingabire, coordenadora da Coalização Nacional Contra a Violência Contra a Mulher. “Ainda que massivamente violadas, foram as ruandesas que tiraram o país do caos. Isso enfraqueceu o machismo tradicional”, acrescenta ela.
Ao longo do período pós-genocídio, as mulheres passaram a comandar quase um terço dos lares, ocuparam empregos antes reservados aos homens (em particular nos setores da construção civil e da mecânica), e aderiram massivamente aos partidos políticos. Participaram da elaboração da Constituição de 2001 e conseguiram inscrever nela um sistema de cotas que reserva às mulheres 30% dos postos em todos os órgãos decisórios, assim como o direito à herança. Exigiram também a criação de um Ministério de Gênero e da Condição Feminina e foram bem-sucedidas na implementação de Conselhos nacionais femininos, que constituem um exemplo de representação das mulheres em todos as esferas de poder, desde o bairro até o nível mais alto da nação. No governo, os Ministérios da Indústria, da Agricultura, das Relações Internacionais e da Energia estão a cargo de mulheres.
Trabalho precarizado
As dificuldades, contudo, persistem. Segundo um relatório oficial, “74% dos secretários-gerais dos Ministérios são homens, assim como 81% dos diretores e 67% dos funcionários. As mulheres predominam, sobretudo, nos cargos de assistência administrativa e secretariado”. Do mesmo modo, na iniciativa privada, “as mulheres permanecem majoritárias nas atividades precárias e mal remuneradas no setor informal […] e são proprietárias de apenas 18% das empresas”. Em relação à violência, a situação continua sombria: “Existe uma verdadeira vontade política, mas ainda é preciso fazer as mentalidades evoluírem e mostrar que a cultura não é imutável, que toda cultura é capaz de transformar suas tradições. Atualmente, viso às novas gerações”, diz Ingabire.
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