As terras navegam: desde a deriva dos continentes que estão dando a volta ao mundo, até a sua movimentação no tempo, para o passado, para o futuro, ou simplesmente para o lado, no espaço.
É difícil dizer agora para onde está indo a Europa. Há uma grande confusão no ar. O continente está assolado por crises e mais crises. Volta e meia os vulcões islandeses, com seus nomes impronunciáveis para nós, forçam os aviões a aterrisagens forçadas. Países estão insolventes, com dívidas públicas gigantescas, ameaçando a moeda relativamente recém-criada, o euro. Enquanto a Alemanha promete abandonar a energia nuclear, os países do antigo leste europeu prometem fazer de tudo para implementá-la.
Aliás, a antiga divisão leste-oeste (que era geopolítica e não geográfica; por exemplo, a Áustria, do bloco oeste, fica no mesmo meridiano da República Tcheca e da Eslovênia, que eram do bloco leste) está dando lugar a uma divisão mais drmaticamente acentuada norte-sul. A Europa do "norte" alinha países bem comportados, que fizeram a lição de casa, isto é, seguiram as receitas privatizantes, reduziram salários, aposentadorias, aumentaram o tempo de serviço, etc., na conhecida receita da ortodoxia econômica. A Europa do "sul" reúne países perdulários, endividados, que foram lenientes com seus funcionários públicos, cujas populações "tiram férias demais", etc. A França é um país tão mediterrâneo quanto a Espanha; mas a França "é do norte" e a Espanha "é do sul", membro dos países que agora precisam ser disciplinados pelos "do norte". Graças a esses países "desalinhados" (não mais no antigo sentido da guerra fria) a Europa vê-se na contingência de recorrer ao FMI e seu monitoramento, como se fosse uma Argentina, um México, um Brasil, ou um país do sudeste asiático do século passado. Quer dizer: se a América do Sul está indo para o século XXI, a Europa parece estar regredindo ao século XX.
Como se não bastasse tudo isso, a Alemanha (primeiro) e o continente inteiro (agora) se vêem às voltas com um surto de uma bactéria nova, uma variação da velha Escherichia Coli que apresenta uma violência inaudita - coisa, convenhamos, que antes era digna de Áfricas e Américas Latinas.
Certo que houve, no passado, a crise da vaca louca, a partir da Inglaterra. Mas aquilo, pelo menos, era coisa de ração industrializada. Agora não: o problema parece ser mesmo de natureza higiência e sanitária, na cadeia que vai da produção ao consumo, passando pelo armazenamento e distribuição de vegetais. E põe tudo sob suspeição: dos tomates por vezes carregados de agrotóxicos aos brotos de feijão de culturas orgânicas (aqui se diz bio), sem falar nos pepinos e as alfaces.
A Escherichia Coli desencadeou várias crises. Na Alemanha, foco da epidemia, o Ministério da Saúde está sob ataque, acusado de lerdez e despreparo. Até o sistema federativo entrou na dança, porque o Instituto que lidera o combate à epidemia, o Robert Koch, de Berlim, não consegue autorização para entrevistar os pacientes no norte do país, tarefa reservada às autoridades e agentes locais. Os primeiros casos da doença foram registrados no dia 1 de maio; mas somente no dia 19 um hospital de Hamburgo, a o receber vários pacientes em poucos dias com o contágio, deu o alerta e mobilizou o Instituto Robert Koch, no que hoje é percebido como uma "perda" de 18 dias - prazo em que a doença se disseminou e provavelmente em que a causa originária dela foi destruída.
Em nível continental, as crises foram várias. Os primeiros acusados pela origem do mal foram os pepinos espanhóis, logo depois inocentados. Mas as perdas conseqüentes foram imensas: 200 milhões de euros por semana para os agricultores do sul da Espanha, sobretudo. Na Alemanha as perdas dos agricultores vão a 5 milhões de euros por dia. A Rússia suspendeu a importação de hortaliças de todo o tipo de toda a Europa, ferindo de morte um negócio de 5 bilhões de euros anuais. Aos pepinos juntaram-se tomates e alfaces, mais os referidos brotos de feijão, sem provas concludentes até agora.
A perplexidade é geral. Àquela provocada pela disseminação das doenças e das crises, soma-se esta, mais soturna, ainda sem avaliação precisa: a velha Europa não é mais a mesma. Para onde ela vai? Recentemente o presidente Obama declarou que, por mais emergentes que haja, os Estados Unidos e a Europa continuarão a influenciar a humanidade.
Sim, mas daqui para frente talvez como exemplos negativos.
Texto Flavio Aguiar no BLOG DO VELHO MUNDO
Nenhum comentário:
Postar um comentário