MUDANÇAS CLIMÁTICAS – ESTAMOS NO LIMITE DA META DE 2 GRAUS


 
Há três semanas chegou à imprensa um rascunho do que será o próximo relatório do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) Trata-se de um documento preliminar, mas a mensagem é clara: o risco de provocar danos severos e irreversíveis ao clima é real e é urgente a necessidade de reduzir drasticamente  as emissões de gases de efeito estufa. Este alerta dos cientistas contrasta de forma brutal com a indiferença dos governos e grandes corporações que dominam o mercado global.
A versão final do documento está sendo discutida na sede da ONU em N. York hoje, 23 de setembro. Convocada por Ban Ki-moon, o encontro reuni lideres de governos e do setor privado para discutir medidas concretas orientadas para reduzir as emissões em ações de curto prazo.
O mundo carece atualmente de um quadro regulamentar sobre as alterações climáticas e o processo de negociações para alcançar compromissos políticos é um caos. A cúpula de N.York é, essencialmente, uma reunião para se conversar. A COP20 em dezembro em Lima só poderá avançar até um projeto para um novo tratado sobre mudanças climáticas. Terá que esperar até a COP21 em 2015 para ver que tipo de monstro emerge deste longo processo de compromisso e transações.
Os resultados do quinto relatório de avaliação do IPCC indicam que o aquecimento do sistema climático é um fenômeno indiscutível e algumas das mudanças observadas nas últimas seis décadas não tem precedente por milhares de anos. O aquecimento observado na atmosfera e oceanos; volume de gelo e a quantidade de neve caíram; o nível do mar subiu.
Estudos do IPCC mostram que as observações acima são correlacionados com o aumento da concentração de gases do efeito estufa (GEE) na atmosfera. O principal GEE é o dióxido de carbono (CO2) e vem principalmente dos combustíveis fosseis e processos industriais e, em menor grau, de desmatamento e alterações no uso da terra. O inventário de GEE inclui outros gases mais potentes em sua capacidade de reter a radiação infravermelha (como o metano) e, embora seja necessário reduzir essas emissões, o principal contribuinte para a mudança climática é o CO2.
O relatório afirma que se as emissões não forem reduzidas as conseqüências serão irreversíveis. Há ainda indícios de que elas estão crescendo mais rápido, e a capacidade de absorção de uma parte desse gás que até aqui é feito pela biosfera está se reduzindo. Alguns analistas dizem que não só estamos caminhando na direção errada como estamos fazendo isso rapidamente.
Talvez a descoberta mais surpreendente do relatório esteja relacionada com as reservas de hidrocarbonetos e seu destino final. Cerca de 80% dos combustíveis fósseis. Que são conhecidos por existir em várias formas, teria de permanecer onde está para o planeta não ultrapassar o limite de um aquecimento de 2 graus Celsius (em relação à temperatura média anterior à revolução industrial) Ou seja, quatro quintos das reservas de combustíveis fósseis teria que permanecer inexplorada.
A economia mundial adotou há muitas décadas um perfil de energia que é totalmente dependente de combustíveis fósseis. Mudar o perfil associado a essa infraestrutura é um processo caro e lento. Não vai precisar apenas de fontes alternativas de energia, também é preciso mudanças na forma de de transportar e consumir essa energia. Mas
as grandes empresas do setor de energia se comprometeram com esse perfil tecnológico e não estão preparadaspara mudar isso antes de amortizar seus investimentos. As mudanças devem ser introduzidas em uma longa lista de bens de consumo duráveis. E ainda há mais. Grandes empresas do setor de energia do mundo estão gastando bilhões
De dólares na exploração e extração de combustíveis fósseis. E se por um passe de mágica a decisão de deixar 80% das reservas intactas, essas empresas teriam que aceitar o cancelamento de milhares de milhões de dólares de ativos que são o valor dessas reservas. As ramificações de uma mudança radical na estrutura financeira dessas empresas são muito grandes e envolvem uma profunda transformação do sistema financeiro.
A resistência à mudança não vem apenas de uma infraestrutura rígida de produção e consumo de bens, também vem do setor financeiro. E se alguém pensa que o cancelamento de ativos é um simples exercício de contabilidade, lembrar o domínio do capital financeiro é a principal característica do atual estágio do capitalismo mundial.
Texto do economista Alejandro Nadal, conselheiro editorial do SINPermiso

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